Domingo é dia de Oscar,
existe uma expectativa, bolões, retrospectivas de outros ganhadores (tem uma
ótima aqui, mostrando que dos últimos 50 ganhadores de melhor filme somente 7
eram sobre mulheres) e, claro, um congestionamento nos cinemas. Para mim -
porque na minha cidade - é a melhor época de ir ao cinema, quando muitos indicados
estão em cartaz (tem época do ano que é de dar dó).
Então,
aproveitando essa euforia pré-Oscar fui ontem ao cinema ver
"Lincoln"; e gostei muito do filme e da atuação do Daniel Day-Lewis,
na minha opinião o filme leva nessas duas categorias, que concorre junto com
outras 10. Os EUA gostam de filmes patrióticos e têm adoração por Lincoln. Eu não
sei realmente como foi sua atuação como presidente e seus valores como pessoa,
mas o que ele representa, o que ficou, é algo muito positivo para um povo. Tudo
bem que grande parte disso se deve ao fato de que ele foi assassinado num
teatro, durante uma peça, por um ator que era contra seus ideais e isso é forte
demais, constrói um mártir. Durante o filme eu fiquei pensando se nós teríamos
uma figura assim no nosso país, ou se algum dia teremos (porque essas figuras
quase míticas são construídas com tempo, quando fatos verídicos e lendas vão se
misturando).
Embora "Lincoln" seja um bom filme, com boas histórias, bonito de ver, é desses filmes
que a gente assiste desconfiado (e não é porque sou mineira), porque envolve
dois elementos duvidosos: política e EUA. Por mais bonito que possa parecer, é
difícil aceitar assim, do nada, sem nenhum - ou quase nenhum - interesse que o
presidente dos EUA é um cara bonzinho que quer acabar com a escravidão, e eu
não sei se estou exagerando, mas a minha sensação é que vários outros
propósitos foram escondidos para Lincoln ficar mais carismático, será?! Vou
tentar me explicar melhor, o filme até ajuda neste quesito, acontece que, para
uma pessoa se tornar pública, ter votos e ser eleita para um cargo político há
tantos elementos envolvidos, tanto jogo de interesse que dificilmente a pessoa
passa incólume até chegar a presidência, sei lá, sou meio descrente, acho que a
pessoa pode ter seus valores, mas sua moral fica, digamos, mais volátil.
Entretanto,
o filme não nos trata como tolos, e mostra, no que eu acho o mais interessante,
que para Lincoln conseguir aprovar a emenda constitucional que acabaria com a escravidão no país, ele tem que prorrogar o fim da guerra civil entre norte e sul dos
EUA, que já durava 4 anos e estava na iminência de acabar. Contudo, se ele
resolvesse acabar com a guerra não conseguiria aprovar a emenda (já que ela
passou, para a maioria dos representantes, como um motivo para o fim da guerra,
não como o fim da escravidão) e então, o presidente vive um dilema: quem
sacrificar? E é também uma aposta, pois para aprovar a emenda tem que convencer
não só a maioria do seu partido, como também parte dos democratas.
Infelizmente
tenho que admitir minha ignorância com relação à história dos EUA, mas eu não
sabia, e achei interessante neste processo, que Lincoln fosse republicano e que dentro do partido havia tantos pró-abolição (como Thaddeus Stevens, interpretado
por Tommy Lee Jones, gracioso com aquela ‘peruquete’) enquanto que os democratas
fossem tão retrógrados (pelo menos neste aspecto), sendo que é hoje o partido
de Obama, presidente e negro.
E
por mais que o filme seja antigo, 1865, nem faz tanto tempo assim se
considerarmos a história do mundo, para que pensar em abolição seja difícil,
pensar em voto dos negros impossível e em votos para mulher praticamente uma
brincadeira de mau gosto (gostei dessa cena, não no sentido bom). E Lincoln é
um filme totalmente masculino, quase não existe mulher em cena, eu contei 3,
uma que trabalha na casa de Lincoln e tem uma conversa franca com o presidente,
outra que também é negra e tem que fingir ser criada, apesar de ser esposa de Thaddeus (foi uma cena bem bonita, viu?! Não sei se baseada em fatos reais...) e
outra a esposa de Lincoln que é retrata como uma mulher instável e enjoada (não
gostei dela nem da atuação de Sally Field). Enfim, eu descrevi rapidamente as 3
que, sei lá, durante os 150 minutos de filme devem representar uns 0,01% do
elenco.
Eu
não sei se faz parte do mito Lincoln, mas além de Daniel Day-Lewis está
incrível no papel, Lincoln foi um cara espetacular em seu modo de agir e de
pensar, com a expressão sempre tranquila, quieto, quando falava era sempre com
uma voz calma (até na hora em que ficou irritado, bateu na mesa e a fala foi
mansa...) e pausada, sei não viu, eu queria ser assim quando crescer... Vi em
alguma crítica falando que o filme é bem parado, e até concordo um pouco, eu
estava morrendo de sono, a sessão no cinema muito tarde, mas eu acho que o filme
tem o ritmo do próprio Lincoln que Spielberg quis apresentar.
Tanto
o início quanto o final do filme foram rápidos, deixando mesmo a ênfase no
período final de vida do presidente e creio, sua principal contribuição ao
país, que a abolição da escravatura fosse votada democraticamente, não sendo
apenas a decisão de uma assinatura, e as dificuldades de convencer 2/3 dos
homens que representam um país tão grande e diverso. O fim, que imagino todos
esperavam ser mais relevante, tratou muito rápido a morte do presidente, que
apesar de americano, saiu do mundo para entrar para a história.
Lincoln (EUA, 2012) ****
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