domingo, 10 de fevereiro de 2013

41° - "Precisamos falar sobre Kevin"


"Precisamos falar sobre Kevin" é uma porrada, dessas assim no meio da cara. O filme foi tão chocante pra mim que ao final estava tão irritada e me perguntando: por que alguém faz um filme (ou escreve um livro) assim? Fiquei nervosa mesmo, porque o filme te deixa tão desconfortável que você se pergunta: pra quê?
Mas depois o tempo vai passando, você vai se acalmando e as coisas vão fazendo sentido, não o filme e sua história, mas as maravilhas que o cinema pode proporcionar, viver tantas histórias, descobrir tantas possibilidades, pensar sobre elas, aprender a relativizar, a tolerar. Isso pra mim é a magia mais bonita de um filme, e que é bem próxima a de um livro. Por falar em livro, por mais que eu entenda melhor a história de Kevin, eu ainda acho que não teria estômago para lê-la, uma coisa é passar, sei lá, duas horas, outra são horas e dias, remoendo, se entristecendo... E claro que existe beleza na tristeza, mas não, essa eu passo, obrigada. Quem sabe algum dia...
Isso tudo porque "Precisamos" é um filme pesado, denso e tenso. Tem violência, mas ela não é do tipo que estamos acostumados com Bruce Lee, ela é emocional, doída. Se me permitem uma piada, deveria ser utilizada em campanhas de controle de natalidade. Se você tem dúvidas se quer ter filhos não deveria assisti-lo (ou sim), porque o filme trata de um assunto difícil que é: você não tem controle sobre seu filho. É óbvio que há a educação, mas boa parte do que ele é ou vai ser depende da personalidade dele. E se seu filho nascer psicopata? Mais uma vez endosso que a educação e o carinho resolvem muita coisa, mas não tudo, coitado dos pais, muitas vezes carregam um fardo pesado demais, se sentem responsáveis demais pelo ser humano que @ filh@ resolveu ser...
"Precisamos" começa com um vermelho em excesso, numa festa, na casa e no carro de Eva (Tilda Swinton).  Realizado em flashbacks, mais tarde vamos entendendo o motivo de Eva ser tão rejeitada pela comunidade: seu filho Kevin. Mostrando presente e passado, percebemos que Eva era uma mulher feliz e tinha um relacionamento feliz com Franklin (John C. Reilly, que faz um marido muito parecido com o que fez em "As horas"), só que ela engravida sem desejar e Franklin quer ter o bebê. Ela não se sente feliz grávida, não se sente feliz com o filho pequeno e Kevin não gosta dela desde sempre. Aqui muita gente pode alegar que Kevin já se sentia rejeitado por ela, mas perae, Eva tentou, ela se sente culpada por não ser maternal (como na cena da hidroginástica, ou algo assim, quando está grávida, no vestiário, cheio de mulheres grávida - e lindas - exibindo suas barrigas e ela se sentindo um ET), em nenhum momento ela destrata o filho (pensem aqui na mãe de “Preciosa”, isso sim é um mãe má e cruel com a filha), não se sente a vontade no papel de mãe, mas não pode ser culpada pela personalidade e pelas atitudes do filho; mas se sente, e prova disso é que aceita com resignação a hostilidade da comunidade frente à atitude de seu filho.
Estou enfatizando aqui meu ponto de vista porque lembro exatamente de quando fui pegar o filme na locadora e a atendente me disse que só uma pessoa – “que era meio doida” – defendeu a mãe... Gente! O carinho, amor, afeto são fundamentais para a criação de um ser humano saudável emocionalmente, mas a falta disso não gera, necessariamente, o contrário: um ser humano despido de sentimentos como é Kevin, isso é ônus demais para os pais carregarem.
Então Eva se sente totalmente desajustada no papel de mãe, mas ela insiste, não desiste, não passa pra ninguém sua responsabilidade. Há uma cena ótima, quando ela passeia com Kevin ainda bebê e ele não para de chorar, e Eva para ao lado de uma construção ao som de britadeiras e, enfim, relaxa... Pensem no sofrimento desta mulher... O pai tem afinidade com o filho desde pequeno, mas trabalha fora e convive bem menos com ele do que a mãe.
Kevin vai crescendo e a gente vai percebendo como ele é verdadeiramente ruim. A única atitude realmente condenável da mãe é dizer, na frente de Kevin quando ele era criança, que a vida dela seria mais feliz sem ele. Gente e o menino é ruim mesmo, faz tudo para desagradá-la, não fala, usa fraldas até mais velho, rabisca o quarto que ela decorou com carinho e, principalmente, faz um jogo psicológico muito forte com a mãe, e ela se sente culpada, como se sente. Kevin sabe disso e usa essa culpa o tempo todo, como na cena na qual a mãe o vai visitar na cadeia (quando está mais velho), ela fala algo e ele põe o dedo na cicatriz que ele tem graças a uma queda por conta de um acesso de raiva da mãe, e isso é o suficiente para que ela mude de assunto.
Kevin cresce, deve ter uns 16 anos e ainda continua ruim. Eva tem outra filha, que é um doce e a mãe a aceita muito melhor, como uma mãe deve ser. Mas Kevin continua a fazer suas maldades, mata o coelhinho (ou algum bichinho que a irmã ganhou de natal) e ainda colabora no acidente em que a irmã perde um olho (tadinha...).
Sabe o que me irritou ainda mais? O pai. Franklin é um bocó (mais uma vez, muito parecido com “As horas”), não percebe nada e ainda não acredita na mulher, e Kevin se faz de bom moço na frente dele, o que irrita ainda mais Eva (ou a mim que estava assistindo).
O final do filme é esperado, já sabemos que Kevin está preso e que a sociedade condena não só o filho, mas também a mãe e por isso podemos ter alguma ideia do crime cometido, mas não, é pior, Kevin faz seu último ato, de uma maldade sem limites com a mãe, a deixa viva, mais culpada ainda.
Para viver ela, que antes tinha um emprego respeitável, tem que trabalhar como uma assistente numa agência de viagens, tirando xerox e fazendo pequenas coisas, e ainda tem que ouvir desaforos e ofensas dos colegas.
Bem, “Precisamos” não é pra qualquer um, não é pra qualquer dia, mas é um filme intrigante, que te põe pra pensar sobre a vida, sobre as pessoas e é por isso que merece ser visto.
Precisamos falar sobre Kevin (We need to talk about Kevin, EUA, 2011) ***

Nenhum comentário:

Postar um comentário