Pelo que li -
superficialmente - na internet, os espectadores tiveram uma impressão bem
diferente da minha em "Obrigado por Fumar"; que é fantástico e
certamente um dos meus preferidos. Tenho que admitir que, antes de vê-lo pela
primeira vez, eu tinha um certo preconceito com o título, pois achava que era
um documentário do tipo "Super size me" falando sobre os malefícios
do cigarro, mas não, o filme não tem nada disso, nem chega perto; porque apesar
de muita gente falar o contrário, o filme não é sobre o tabagismo (ele poderia, e o faz no fim do filme, estar defendendo qualquer outra coisa ou tema).
"Obrigado por fumar" fala sobre a importância das palavras e, principalmente o poder das palavras, o poder de quem tem o dom da fala (sinceramente me lembrou bem a conturbada entrevista do Silas
Malafaia no "de frente com Gabi" exibido ontem).
Nick
Naylor (Aaron Eckhart) é lobista da indústria do tabaco nos EUA e o filme mostra como
ele desenvolve seu ponto de vista, "sou pago para falar. Não sou doutor,
nem advogado. Sou bacharel em ofender e em ser xingado". Isso porque
defender o cigarro numa sociedade cada vez neurótica com o politicamente
correto e com a 'vida saudável' não é pra qualquer um, e também pudera, lá no
início do filme Nick diz, "há Átila, Gengis e eu representante dos
cigarros" que mata 1.200 pessoas por dia nos EUA. Pronto, chegamos num
ponto fantástico do filme, ele não faz apologia a nada, não está a fim de
levantar bandeira e blábláblá. Com relação ao cigarro (que é o pano de fundo da
questão) Nick está certo e errado, assim como Ortolan Finistirre (William H. Macy, que está no também ótimo "Fargo") o senador, que aparentemente tem boas
intenções em levantar a bandeira do anti-tabagismo (apesar de serem ideias
ridículas), mas na verdade o faz para se promover como político.
O
filme chega até a beirada do relativismo porque ele mostra que mesmo num
assunto tão polêmico - e em princípio óbvio - há espaço para verdades e
mentiras. Afinal, o que é verdade? O que é certo? Qual é a atitude
verdadeiramente desinteressada? Nick Naylor defende então a beleza do
argumento, se você argumentar corretamente nunca estará errado. Mas é o próprio
Nick que fala ao filho que este tipo de trabalho não é pra qualquer um, porque
é necessário certa "flexibilidade moral" que poucas pessoas têm. No
processo de ganhar na fala, nem sempre atacar ao argumento do adversário é a
melhor saída, mas simplesmente provar que está errado (como na cena na qual
Nick e seu filho conversam num parque de diversões e ele pede para o filho
defender o sorvete de chocolate enquanto ele defende o de baunilha).
O papel de Nick Naylor é
ter o controle da mídia, é aparecer em situações diversas e tentar minimizar os
efeitos negativos que a indústria do tabaco tem na sociedade (a cena inicial é
ótima, ele consegue reverter a ideia do programa e ainda termina apertando a mão
do rapaz com câncer, levado obviamente para demonstrar os malefícios do
cigarro), e o cara é fantástico em seu poder de persuasão, na frieza com a qual
ouve os outros argumentos (sempre, taticamente, com um sorriso no rosto) e na
falta de paixão para defender seu ponto de vista (fundamental para não perder o
equilíbrio numa discussão).
Há outra cena excelente,
onde Nick é sequestrado e os bandidos enchem seu corpo com adesivos de nicotina
e quando Nick acorda no hospital seu médico diz que os cigarros salvaram sua
vida, pois nenhum não fumante aguentaria a quantidade de nicotina que tinha no
sangue!
Eu poderia aqui citar
todas as cenas do filme, porque são excelentes, com ótima edição e apresentação
dos personagens, bonitas de ver e, claro com diálogos afiados. Gosto também dos
“Mercadores da Morte”, outros dois lobistas e amigos de Nick (uma defende o
álcool e o outro as armas), os três se reúnem uma vez por semana para comer
juntos e conversar; tem uma cena ótima na qual os três discutem sobre qual tema
é mais polêmico e qual dos três tem mais risco de ser sequestrado por conta
do número de morte que as indústrias que representam proporcionam na sociedade.
“Obrigado” ainda tem uma sacada excelente, nenhum cigarro foi aceso ou fumado durante o filme que fala sobre a importância de cigarros em filmes como propaganda para a indústria. Foi dirigido
por Jason Reitman o mesmo de "Juno" e "Amor sem escalas", outros filmes também ótimos; e é
uma comédia irônica, inteligente, com piadas sagazes e muito, muito divertida.
“Michael Jordan joga
bola. Charles Manson mata pessoas. Eu falo. Todos têm um talento”.
Obrigado por fumar (Thank
you for smoking, EUA, 2005) *****
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