Hoje é dia internacional
das mulheres, recebi muitos parabéns pela rua, mas é triste perceber que grande
parte das pessoas, das mulheres, não tem consciência do que este dia
representa, por que ele existe. A data tem a ver com a origem de manifestações
de mulheres russas por melhores condições de trabalho, e embora seja clichê
afirmar, no dia das mulheres eu não quero receber rosa na rua ou abraços de
parabéns, eu quero receber respeito das pessoas, consciência das diferenças de
gênero, mas da igualdade de tratamento, seja na vida social, na vida
profissional. Eu tenho a sorte de viver rodeada por homens feministas como meu
pai, meu marido, amigos, mas mesmo assim eu, que sou professora concursada, já
me peguei olhando pra parede da sala de reuniões na instituição federal na qual
leciono e vendo as fotos de todos os diretores que a instituição já teve, e não
ter uma mulher sequer. Eu posso dizer que, infelizmente, por ser mulher e ser
nova, muitas vezes fui menosprezada nas reuniões com maioria absoluta de
homens, fui chamada de "minha filha", fui marginalizada. Para mim, na
minha realidade, o machismo aparece em pequenos detalhes nos discursos do dia a
dia, nas escolhas, nos silêncios. Então sim, vivemos numa sociedade machista e
apesar de não ser militante, sou feminista de coração (enquanto o machismo
prega a superioridade masculina o feminismo não é o contrário, não prega a
superioridade feminina, mas a igualdade de tratamento entre os gêneros).
Sendo
assim, minha homenagem ao dia das mulheres é apresentar o filme que considero
um filme feminino e feminista. "Thelma & Louise" é um filme que
já, desde a cena inicial, mostra a que veio, é a cena com uma paisagem bucólica
muito bonita e uma estrada de terra, a cena que é apresentada vazia será
reapresentada ao final do filme, no momento de perseguição da polícia. Logo
depois já corta para a cena que apresenta Louise (Susan Sarandon), que é uma
garçonete independente, organizada e amiga de Thelma (Geena Davis), que é uma
mulher desorganizada, infantil e casada com um cara que é praticamente uma
caricatura, se infelizmente a gente não soubesse que realmente existem maridos
assim: além de tratar com descaso Thelma ele acha que ela é sua posse, um
objeto (quando Thelma fala à Louise que tem que pedir permissão ao marido ela
lhe pergunta: "ele é seu marido ou seu pai?").
Louise
convida Thelma para passar o fim de semana no chalé de um gerente que está para
se divorciar e empresta a casa para amigos antes de vendê-la, Thelma parte com
Louise sem avisar ao marido. Então o filme se torna oficialmente um road-movie, e apesar de haver nele seus
principais elementos: a estrada como uma metáfora para a transformação, é um road-movie centrado na fuga: num
primeiro momento elas estão fugindo da vida, do marido e namorado, e depois
literalmente fugindo da polícia.
Isso
porque ao pararem num bar para beber um pouco e relaxar antes de seguir viagem,
Thelma e Louise conhecem Harlan, um cara aparentemente com boas intenções, que se
interessa por Thelma, lhe paga bebidas, a leva para dançar, mas quando ela se
sente mal vai com ela pra fora do bar, no intuito de lhe ajudar, e tenta estuprá-la;
quando ele está prestes a consumar o ato, Louise chega armada, ele larga Thelma
e quando ambas estão indo embora ele lhe fala algumas bobagens - dessas que,
infelizmente, não são novidades - do tipo "chupa meu pau"... e ela
atira, é um êxtase!
Depois
do acontecido Thelma tenta persuadir Louise a procurar a polícia para relatar o
acontecido, mas ela já lhe garante: "ninguém acreditará em nós, você
estava dançando com ele, ninguém acreditará que ele tentou te estuprar",
taí uma verdade jogada na tela, muitas mulheres que são vítimas de violência
sexual ainda levam a culpa, a vítima nunca é culpada, nem por sua roupa, nem
por sua atitude: uma mulher pode estar nua ao lado de um homem e se disser não
e o cara seguir em frente usando a força, contra a vontade da mulher, ainda
assim será estupro, nada justifica um estupro além da própria maldade do
estuprador!
Então
as amigas precisam começar a pensar num plano de fuga que vai levar ainda em
muitas confusões, é claro que a gente se simpatiza com Louise de cara, porque
ela é forte, decidida, mas o melhor papel é de Thelma, ela sofre uma metamorfose
radical no filme, se no começo era infantil, boba, inocente (chega a dar raiva,
porque depois que ela sofre a violência sexual ainda dá mole com JD - Brad
Pitt), mas depois ela se transforma depois que ela se resolve sexualmente (tem
seu primeiro orgasmo com JD) ela se torna decidida, positiva, e troca de lugar
com Louise, é muito bacana de ver.
No
filme absolutamente feminino (o único Oscar que ganhou foi de melhor roteiro
original, escrito por uma mulher) os poucos homens que aparecem são o gatilho
de toda modificação (e confusão) que as amigas sofrem: seja o namorado de Louise, o marido
de Thelma, Harlan, JD. O único homem que tem uma empatia com a situação delas é o
policial Hal (Harvey Keitel). E ainda tem a ótima cena na qual elas explodem o
caminhão, pode até ser exagerado, mas combina com o contexto e desenvolvimento
do roteiro e, sinceramente, o caminhoneiro mereceu, é uma catarse para todas
nós que já nos sentimos, em algum momento da vida, intimidadas por homens que
passam por nós na rua falando palavras chulas, fazendo gestos obscenos (e sim
isso é para intimidar, ou eles acreditam que nos convencerão a fazer sexo?).
Nesse processo delicado de transformação o final não poderia ser melhor e mais
bonito, porque infelizmente na vida delas e na postura que assumiram elas não
tinham escolha, mas para nós, expectadoras, fica a esperança de que o
conhecimento, que a consciência da nossa situação, é o principal fator de
mudanças, viva as mulheres!
Thelma
& Louise (EUA, 1991) *****
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