sexta-feira, 8 de março de 2013

67° - "Thelma & Louise"


Hoje é dia internacional das mulheres, recebi muitos parabéns pela rua, mas é triste perceber que grande parte das pessoas, das mulheres, não tem consciência do que este dia representa, por que ele existe. A data tem a ver com a origem de manifestações de mulheres russas por melhores condições de trabalho, e embora seja clichê afirmar, no dia das mulheres eu não quero receber rosa na rua ou abraços de parabéns, eu quero receber respeito das pessoas, consciência das diferenças de gênero, mas da igualdade de tratamento, seja na vida social, na vida profissional. Eu tenho a sorte de viver rodeada por homens feministas como meu pai, meu marido, amigos, mas mesmo assim eu, que sou professora concursada, já me peguei olhando pra parede da sala de reuniões na instituição federal na qual leciono e vendo as fotos de todos os diretores que a instituição já teve, e não ter uma mulher sequer. Eu posso dizer que, infelizmente, por ser mulher e ser nova, muitas vezes fui menosprezada nas reuniões com maioria absoluta de homens, fui chamada de "minha filha", fui marginalizada. Para mim, na minha realidade, o machismo aparece em pequenos detalhes nos discursos do dia a dia, nas escolhas, nos silêncios. Então sim, vivemos numa sociedade machista e apesar de não ser militante, sou feminista de coração (enquanto o machismo prega a superioridade masculina o feminismo não é o contrário, não prega a superioridade feminina, mas a igualdade de tratamento entre os gêneros).
Sendo assim, minha homenagem ao dia das mulheres é apresentar o filme que considero um filme feminino e feminista. "Thelma & Louise" é um filme que já, desde a cena inicial, mostra a que veio, é a cena com uma paisagem bucólica muito bonita e uma estrada de terra, a cena que é apresentada vazia será reapresentada ao final do filme, no momento de perseguição da polícia. Logo depois já corta para a cena que apresenta Louise (Susan Sarandon), que é uma garçonete independente, organizada e amiga de Thelma (Geena Davis), que é uma mulher desorganizada, infantil e casada com um cara que é praticamente uma caricatura, se infelizmente a gente não soubesse que realmente existem maridos assim: além de tratar com descaso Thelma ele acha que ela é sua posse, um objeto (quando Thelma fala à Louise que tem que pedir permissão ao marido ela lhe pergunta: "ele é seu marido ou seu pai?").
Louise convida Thelma para passar o fim de semana no chalé de um gerente que está para se divorciar e empresta a casa para amigos antes de vendê-la, Thelma parte com Louise sem avisar ao marido. Então o filme se torna oficialmente um road-movie, e apesar de haver nele seus principais elementos: a estrada como uma metáfora para a transformação, é um road-movie centrado na fuga: num primeiro momento elas estão fugindo da vida, do marido e namorado, e depois literalmente fugindo da polícia.
Isso porque ao pararem num bar para beber um pouco e relaxar antes de seguir viagem, Thelma e Louise conhecem Harlan, um cara aparentemente com boas intenções, que se interessa por Thelma, lhe paga bebidas, a leva para dançar, mas quando ela se sente mal vai com ela pra fora do bar, no intuito de lhe ajudar, e tenta estuprá-la; quando ele está prestes a consumar o ato, Louise chega armada, ele larga Thelma e quando ambas estão indo embora ele lhe fala algumas bobagens - dessas que, infelizmente, não são novidades - do tipo "chupa meu pau"... e ela atira, é um êxtase!
Depois do acontecido Thelma tenta persuadir Louise a procurar a polícia para relatar o acontecido, mas ela já lhe garante: "ninguém acreditará em nós, você estava dançando com ele, ninguém acreditará que ele tentou te estuprar", taí uma verdade jogada na tela, muitas mulheres que são vítimas de violência sexual ainda levam a culpa, a vítima nunca é culpada, nem por sua roupa, nem por sua atitude: uma mulher pode estar nua ao lado de um homem e se disser não e o cara seguir em frente usando a força, contra a vontade da mulher, ainda assim será estupro, nada justifica um estupro além da própria maldade do estuprador!
Então as amigas precisam começar a pensar num plano de fuga que vai levar ainda em muitas confusões, é claro que a gente se simpatiza com Louise de cara, porque ela é forte, decidida, mas o melhor papel é de Thelma, ela sofre uma metamorfose radical no filme, se no começo era infantil, boba, inocente (chega a dar raiva, porque depois que ela sofre a violência sexual ainda dá mole com JD - Brad Pitt), mas depois ela se transforma depois que ela se resolve sexualmente (tem seu primeiro orgasmo com JD) ela se torna decidida, positiva, e troca de lugar com Louise, é muito bacana de ver.
No filme absolutamente feminino (o único Oscar que ganhou foi de melhor roteiro original, escrito por uma mulher) os poucos homens que aparecem são o gatilho de toda modificação (e confusão) que as amigas sofrem: seja o namorado de Louise, o marido de Thelma, Harlan, JD. O único homem que tem uma empatia com a situação delas é o policial Hal (Harvey Keitel). E ainda tem a ótima cena na qual elas explodem o caminhão, pode até ser exagerado, mas combina com o contexto e desenvolvimento do roteiro e, sinceramente, o caminhoneiro mereceu, é uma catarse para todas nós que já nos sentimos, em algum momento da vida, intimidadas por homens que passam por nós na rua falando palavras chulas, fazendo gestos obscenos (e sim isso é para intimidar, ou eles acreditam que nos convencerão a fazer sexo?). Nesse processo delicado de transformação o final não poderia ser melhor e mais bonito, porque infelizmente na vida delas e na postura que assumiram elas não tinham escolha, mas para nós, expectadoras, fica a esperança de que o conhecimento, que a consciência da nossa situação, é o principal fator de mudanças, viva as mulheres!
Thelma & Louise (EUA, 1991) *****

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