Há poucos anos Woody
Allen, ao lançar um filme, deu algumas declarações divertidas sobre envelhecer,
para ele a velhice é um mau negócio: "você não fica mais esperto, não fica
mais sábio, não fica mais doce ou mais amável. Nada acontece de fato. Suas
costas doem mais, você tem mais indigestão, sua visão não é boa, você precisa
de ajuda para escutar. Envelhecer não traz, de fato, quaisquer vantagens. Não
ficamos mais inteligentes nem mais generosos. Aceitem o meu conselho: evitem
envelhecer".
Falar sobre velhice é
sempre arriscado, é um assunto cheio de tabus. A verdade é que, se pudéssemos
escolher, evitaríamos mesmo envelhecer: a saúde fica debilitada, a beleza se
vai (porque já estão fora do padrão de beleza) e os velhos são marginalizados
na nossa sociedade que, primando pelo trabalho (pela mão de obra, pelo
dinheiro) desvaloriza àqueles que já não alimentam mais o sistema (mas se
alimentam dele). Se antigamente (e isso ainda resiste, essencialmente em
cidades pequenas) ao velho cabia o papel de interlocutor da tradição e da
sabedoria de vida, nem isso lhe cabe mais. Ao mesmo tempo ser velho ficou
ultrapassado, e as pessoas evitam ao máximo, prolongando a vida adulta com
fórmulas milagrosas. Não dá para culpá-los, ninguém quer ser velho, porque todo
mundo quer ser alguém e o velho é ninguém (estou aqui parafraseando Ecléa
Bosi).
Mas ficar velho é
realmente inevitável - para quem quer, e pode, continuar vivo - e por ser
inevitável a velhice o assunto é evitável, porque dificilmente as pessoas querem
olhar para um espelho, ainda que futuro, principalmente no cinema, num momento
de lazer.
Por esses assuntos
delicados e por outras questões (que eu já falei um pouco aqui) o cinema - que
é o reflexo da nossa sociedade - também não quer falar de velhice e é raro ter
um protagonista velho. Por todos os motivos listados acima, assistir a "E
se vivêssemos todos juntos?" é um deleite. Além de todos os protagonistas
serem velhos, de tratar os tabus da velhice, o filme mostra de uma maneira
delicada, sincera e esperançosa o processo de envelhecimento, este é o enfoque
do filme.
O filme mostra com uma
sinceridade bonita e brutal temas e imagens que dificilmente vemos no cinema,
os velhos ali lidam com uma dignidade incomum os problemas trazidos pelo
envelhecimento. As imagens também são cristalinas, a câmera e os closes não
evitam esconder as rugas e a aparência real, sem – ou com pouca – maquiagem
(maquiagem aqui em vários sentidos).
Neste processo a proposta
do filme é realmente tentadora: e se vivêssemos juntos? E se deixássemos de ser
um problema e fôssemos a solução?
A história é sobre 5
amigos, quatro deles formam dois casais e o quinto, ...., foi amante das duas
mulheres do grupo, há quarenta anos. Mas bem poderia ser na atualidade, porque
"E se vivêssemos" fala, sem pudor e muitas vezes, sobre o sexo, sobre
o desejo, sobre masturbação.
Claude (Claude Rich), o
único solteiro do grupo, tem um ataque cardíaco quando está chegando ao quarto
da garota de programa que visita - e fotografa - com certa frequência. Seu
filho propõe ao pai que feche o apartamento no qual mora sozinho e passe a
viver numa casa de repouso. Os amigos vão visitá-lo, mas diante da situação
(que não é das piores, mas uma casa com velhos debilitados) resolvem levar
embora o amigo e, assim, morarem juntos.
Outros amigos também
estão doentes, como Albert (Pierre Richard) que está com problemas graves de
memória e sua esposa, Jeanne (Jane Fonda, está linda como sempre) que está com
câncer. Mas as doenças são meros coadjuvantes na história, elas fazem parte da
vida, são lidadas com uma clareza e honestidade belíssimas.
Junto com esses
acontecimentos tem Dirk (Daniel Bruhl de “Adeus, Lênin”, “Edukators” e “Bastardos
Inglórios”) que é um estudante de etnologia e pretende fazer sua tese sobre o
processo de envelhecimento dos aborígenes australianos, mas depois muda seu
objeto (sujeito) de pesquisa para os europeus, e vai morar com os amigos a fim
de fazer sua etnografia.
A cena de morte, também outro
tabu, é tratada com humor e generosidade e a cena final é uma linda síntese de
um filme que é todo coerente. Por aqui já estou cooptando meus amigos, "E
se vivêssemos todos juntos?" é um filme, afinal, sobre esperança.
E se vivêssemos todos
juntos? (Et si on vivait tous ensemble?, França, 2012) *****
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